Fábio Vaz: “Educação de tempo integral é uma bandeira que precisa ser seguida”

Secretário diz que modelo de educação nos países desenvolvidos mostrou bons resultados no Brasil e contribui para erradicar a pobreza

O secretário da Educação, professor Fábio Vaz, está otimista com as novas perspectivas para a área de educação a partir de 2023, depois de um período em que, segundo ele, a gestão pública federal deixou a desejar. Ele elogia a escolha de um gestor que já mostrou competência na gestão pública para comandar o Ministério da Educação, o ex-governador do Ceará, Camilo Santana, o que entende ser um indicativo de que o governo federal está buscando fazer o melhor, a partir da adoção de um modelo que virou referência nacional. “Quando leva uma equipe do Ceará para comandar o MEC é porque viu que aquilo ali está dando certo”, defende, o secretário.

Fábio Vaz prevê que este vai ser um ano promissor para a educação no Tocantins. Segundo ele, vai começar de forma efetiva a recuperação dos atrasos provocados pela pandemia. O secretário explica que, após o diagnóstico de proficiência dos alunos, foi desenvolvido um programa com produção de material de suporte para recuperação da aprendizagem. “Hoje nós sabemos a realidade do nosso aluno. Essa carência que foi identificada no período da pandemia precisa ser enfrentada. Em 2023, o governo está preparado. Nós adquirimos material específico, próprio para ser utilizado pelos professores, na recomposição dessas habilidades básicas dos nossos alunos”, ressalta o gestor.

O secretário aponta que o empobrecimento e o aumento do desemprego durante a pandemia ampliaram índices de evasão escolar que já eram preocupantes. Ele defende a necessidade de criação de uma bolsa para segurar o aluno do ensino médio em sala de aula. “Temos a necessidade de termos uma bolsa específica para o ensino médio. É algo importante porque o aluno não é mais uma criança: é um adolescente, que sente necessidade de ter o dinheiro dele, de ter independência financeira. Então, se há uma bolsa permanência para esse aluno no ensino médio, a evasão deve diminuir significativamente”, garante.

Fábio Pereira Vaz é professor de carreira da rede estadual de ensino. Tem formação acadêmica voltada para sua área de atuação. Mestre em Gestão de Políticas Públicas pela Universidade Federal do Tocantins (UFT), tem especialização em Metodologias de Ensino e Linguagem pela Educon e é licenciado em Letras pelo Ceulp/Ulbra. Fábio garante que foi como professor que conseguiu ingressar na política e ascender. O bom desempenho em sala de aula garantiu a eleição como vereador em Palmeirópolis. Em seguida, foi eleito e reeleito prefeito do município, período em que Palmeirópolis passou a contar com um dos melhores índices de desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) do Tocantins. O resultado o fez ser convidado para assumir o comando da Secretaria Estadual da Educação, a convite do governador Wanderlei Barbosa (Republicanos).

Todo aluno da rede estadual terá material para recompor a aprendizagem   

Teve início esta semana o período de matrículas na rede estadual de ensino. Qual é sua expectativa com o retorno às aulas?

Estamos ansiosos e com uma expectativa muito positiva. O ano passado foi um ano de reabertura. As escolas ficaram fechadas durante o período todo [da pandemia da Covid-19] e além da reabertura foi um ano também de diagnóstico. Nós fizemos vários diagnósticos. Contratamos o Caed [Centro de Políticas Públicas e Avaliação da Educação] para fazer um diagnóstico do nível de proficiência de cada aluno, isso foi individualizado e hoje nós sabemos a realidade do nosso aluno. Essa carência que foi identificada no período da pandemia precisa ser enfrentada. Em 2023, o governo está preparado. Nós adquirimos material específico, próprio para ser utilizado pelos professores, na recomposição dessas habilidades básicas dos nossos alunos.

Todo aluno da rede estadual terá um material para recompor a aprendizagem. Questões essenciais: interpretação, raciocínio lógico; em todo ambiente escolar vamos trabalhar muito isso, é recomposição de aprendizagem. Então, vamos trabalhar com Português e Matemática, mas Ciências também vai discutir o mesmo tema, Geografia, o mesmo tema, com o mesmo olhar. O aluno está tendo dificuldade de interpretação, o professor de história vai trabalhar com ele interpretação dentro da aula de história. O professor vai orientar o aluno na utilização do material e a cada 15 ou 20 dias será feita uma avaliação. Isso tudo por mecanismos on-line. A turma responde e a gente passa a ter um resultado após cada simulado. O aluno melhorou aquela deficiência? Se não, ele continua trabalhando a mesma habilidade. Ou então, vamos seguir, vamos passar para algo mais difícil, essa evolução vai ocorrer. Então, é algo que vem ao encontro da necessidade do aluno, de forma individualiza.

Nós não temos um olhar da turma, temos o olhar do aluno. Então, a gente passa a verificar se o aluno supriu aquela deficiência verificada. São questões elementares, cada nível, vai ficando difícil mais um pouco, mais crítico; todas as disciplinas vão trabalhar o mesmo problema, com o mesmo olhar. O Tocantins este ano, tem um material próprio. O livro didático está ali, vai ficar aguardando o momento certo dele, nós vamos iniciar com esse material específico, que é para recompor a aprendizagem perdida ou deixada de ser apreendida durante esse tempo de pandemia.

Quais as séries e áreas de conhecimento que foram mais afetadas com o fechamento das escolas durante a pandemia?

As deficiências são identificadas principalmente em Língua Portuguesa e em Matemática, que compreendem todo o conjunto das disciplinas. O aluno que não consegue ter uma boa interpretação de texto não vai conseguir se desenvolver em nenhuma disciplina. O raciocínio lógico, cálculo, não vai conseguir lincar aquilo com as outras áreas. O nosso diagnóstico revela que o aluno do ensino médio sentiu mais. Para se ter uma ideia, o aluno que terminou o nono ano em 2019, passou 2020 e 2021 em casa, aí ele já estava no 3º ano do ensino médio. Perdeu tudo isso. O retorno foi buscando a melhor estratégia possível. Agora este ano nós temos material específico. Vamos fazer uma recomposição da aprendizagem, é um recomeçar na essência. Esse material vem tudo incluso: desde a formação do professor, o material que vai ser usado pelo professor, o material do aluno, e as avaliações, tudo de forma digital, então vamos ter o resultado em tempo real. O aluno melhorou, nós vamos saber; está estagnado, também vamos saber, com isso vamos poder buscar as soluções para resolver esses problemas.

A maioria dos alunos do ensino médio da população brasileira não tem o luxo de apenas estudar

A Campanha Busca Ativa: Fora da Escola Não Pode é a aposta da secretaria para tentar enfrentar a evasão escolar, outro grande desafio que cresceu com a pandemia. O que propõe a campanha?

Em relação ao aluno do ensino fundamental, isso é menos preocupante, já que nessa fase a evasão é pequena, desde de antes da pandemia e pós-pandemia. Mas, com o aluno do ensino médio, nessa fase a evasão se agravou muito. Esse aluno já tinha dificuldade, que era a necessidade de trabalhar como complementação da renda. Antes da pandemia, o índice de evasão já era muito grande e no pós-pandemia se agravou por vários motivos. Pelo empobrecimento da população, pela necessidade de trabalhar ou pelo tempo que o aluno ficou fora da escola, ele já teve de buscar um meio de sobrevivência. Também tinha muito do conteúdo que era ministrado. O novo ensino médio vem para mudar esta realidade, apresenta um conteúdo mais atrativo, com características mais profissionalizantes. O aluno está na escola para poder interagir escola e vida. O aluno do ensino médio da maioria da população brasileira, que é carente, não tem esse luxo de apenas estudar. Esse é o nosso sonho, que ele pudesse só estudar, mas a gente sabe que a família tem necessidades. Em algum momento esse aluno percebe que se ficar fora da escola vai conseguir o sustento que a família precisa e quando volta para a sala de aula percebe que aquilo que está sendo ministrado não faz parte da sua realidade. Então esse novo ensino médio vem para isso: ter uma trilha formativa voltada para a questão profissional. Aproximar o aluno do campo profissionalizante, aproximar o aluno das suas necessidades de inserção no mercado de trabalho.

O recurso tecnológico vai estar muito presente conectado à tendência de um mundo mais tecnológico

Vejo que a pandemia acelerou os desafios da educação, mas temos estratégias. O governo federal tem estratégias com o novo ensino médio, o governo do Estado do Tocantins tem estratégias. Agora nós vamos iniciar, e acredito que até março ou abril vamos ter chromebooks nas escolas que tem ensino médio. Não é individual para cada aluno, mas para uma escola que tem em torno de 700 alunos, vai receber cerca de 300 chromebooks que é para ter aula com tecnologia. O aluno de ensino médio vai ser obrigatório ter duas aulas por semana de tecnologia. Outro aspecto é que a tecnologia representa atrativo na medida em que permite a pesquisa de conteúdo que o aluno busca. Então o recurso tecnológico vai estar muito presente em 2023, justamente para aproximar dessa tendência de um mundo mais tecnológico em que vivemos e a escola não pode ficar de fora disso. 

O Ministério da Educação definiu como prioridade a alfabetização na idade certa, para combater um fenômeno que o ministro chama de analfabetismo dentro da escola. Como o sr. avalia esta meta?

O Tocantins tem agora o ICMS Educacional. Com ele, 10% do ICMS do Estado, a partir de 2024, que este ano é implementação, vai para práticas educacionais, para os municípios. A alfabetização na idade certa é competência do município. O Estado passa a entender que não tem como melhorar a qualidade da educação no Estado olhando apenas a rede estadual. Eu tenho de olhar os alunos da rede municipal. Estamos falando de território, estamos falando de educação como um todo. A partir do momento em que temos uma compensação financeira os municípios vão poder trabalhar mais a alfabetização, aquele início da vida estudantil da criança que tem repercussão importante em toda a vida. A alfabetização na idade certa é fundamental num processo longo, na vida estudantil como um todo.

Não discutiremos mais educação estadual e municipal, mas educação no território tocantinense

A partir de 2023 estaremos trabalhando com as prefeituras, tendo em vista que eles [prefeitos] têm quesitos a cumprir, caso não cumpram, não receberão dinheiro. É um conjunto de trocas. Vai ter incentivo financeiro para quem trabalhar. Temos também a distorção idade/série, um público que não estudou na idade certa que também é contemplado neste projeto. Nós temos um incentivo financeiro para a correção desse aluno que não estudou na época certa. É um trabalho a quatro mãos. Estado e municípios, nós não discutiremos mais educação estadual e educação municipal, discutiremos educação no território tocantinense.    

A compensação financeira pode ampliar as conquistas e melhorar as parecerias entre estado e municípios?

É olhar para o que deu certo. O Estado do Ceará, é uma referência nacional de educação. Tanto é que o ministro da Educação [Camilo Santana] era governador do Ceará. A secretaria-Executiva do MEC, Isolda Cela [foi vice-governadora do Ceará], era secretária da Educação do Ceará. Essa prática entre estado e município precisa ser presente. Isso precisa acontecer de fato. O Tocantins só poderá comemorar uma melhor educação se todo mundo crescer junto, estado e municípios. É o modelo que o governo federal também vai aplicar. Quando leva uma equipe do Ceará para comandar o MEC é porque viu que aquilo ali está dando certo.

Além do ambiente escolar ser adequado, temos também de ter incentivos

Entendendo que o governo Lula adotou o modelo do Ceará, ao observar os bons índices da educação naquele Estado, o que se pode esperar do novo governo na área da educação?

Estou muito animado. Acabamos de sair de um mandato de um presidente que tinha um olhar para a educação que não contemplava muito as necessidades. Para ter ideia, a alimentação escolar teve seu último reajuste em 2017. Era 33 centavos por criança para alimentação. O programa nacional da alimentação escolar, o Tocantins recebia 33 centavos do governo federal e investia 1 real e pouco, do próprio Estado. Deveria ser programa estadual. Isso se reflete também em todas as áreas. Na construção de novas escolas, transporte, gestão educacional. Acredito muito que o governo federal vai retomar programas importantes, como a educação de tempo integral, que é fantástica. A educação de tempo integral é uma bandeira que precisa ser seguida. É a erradicação da pobreza, amparo à vulnerabilidade social, e o governo federal está com este olhar. Você olha a educação nos países desenvolvidos, é de tempo integral. A criança estuda o dia inteiro. Para isso, precisa ter condições. Além do ambiente escolar ser adequado, nós também temos de ter incentivo, como bolsas de permanência. Um aluno do ensino médio, para que ele possa ficar o dia inteiro na escola, ele não vai poder trabalhar, então tem de ter incentivo. Isso precisa ser trabalhado tanto em nível federal, quando estadual. Nós sabemos dessa necessidade, nós precisamos muito aumentar a nossa rede de tempo integral. Acredito que a política nacional vai ser voltada para atender essas fragilidades sociais. Acho que o governo federal vai possibilitar que os Estados possam ampliar essa oferta. Principalmente porque nós temos um presidente que tem um olhar para os mais carentes. E a escola hoje é o que dá condições para a população carente superar este ciclo, em que às vezes várias gerações se repetem sem conseguir formar os filhos ou ter uma melhora financeira.

Com a bolsa permanência no ensino médio, a evasão vai diminuir significativamente

Qual o impacto de um programa social como o Bolsa Cidadã, no enfrentamento da evasão escolar, sobretudo na realidade do Tocantins?

Tem um público alvo, salvo engano, de 12, 14 anos, que é obrigado estar na escola. Eu espero que o governo federal possa criar mecanismos para contemplar um adolescente, por exemplo, de 17 ou 18 anos que não concluiu o ensino médio, a família para receber a bolsa deveria estar com esse aluno matriculado. Mas também temos a necessidade de termos uma bolsa específica para o ensino médio. É algo importante porque o aluno não é mais uma criança: é um adolescente, que sente necessidade de ter o dinheiro dele, de ter independência financeira. Então, se há uma bolsa permanência para esse aluno no ensino médio, a evasão deve diminuir significativamente.

Hoje, a cada 33 crianças, uma tem diagnóstico de espectro autista

Como o sr. avalia a sanção de leis inclusivas que entraram agora em vigor e que apontam para o fortalecimento da educação especial, diferente do que vinha acontecendo?

Pauta prioritária do governo. O governador Wanderlei tem se mostrado muito sensível a isso tudo. Aqui na secretaria a educação especial tinha uma gerência, agora vai virar uma diretoria de Educação Especial, de educação inclusiva. Ela passa a ter uma robustez. Nós temos hoje um centro de educação especial no Estado. Nós vamos expandir para 13 centros. Em toda cidade que tem uma regional de ensino nós teremos um Centro de Educação Especial. O que é isso? É olhar para esse público que esta aí e que precisa ter assistência. Hoje, a cada 33 crianças, uma tem diagnóstico de espectro autista. Então, olha o volume dessa necessidade. Que está sendo agravada pelo uso incessante de celular, as crianças mexendo com celular o tempo inteiro, só está agravando. Essa criança quando chega à escola precisa que aquela comunidade escolar esteja preparada para ela. A criança que tem algum tipo de síndrome, tem uma inquietação, aprende de uma forma diferente, então tem que ter uma formação específica. O governo do Estado hoje tem um enfrentamento muito forte, além da expansão com estes 13 centros, nós temos formação específica, diagnóstico para as redes estadual e municipal, tendo em vista que a porta de entrada são as prefeituras, as escolas municipais. Nós estamos preparando agora para realizar diagnóstico. Uma criança que tem dois anos e não fala, pode ter alguma deficiência. Se for identificada no momento certo, poderá ser tratada de forma correta, cedo, com resultados satisfatórios.

Que balanço o sr. faz do primeiro governo e o que está planejado para o segundo?  

Essa experiência de um ano e um mês à frente da educação foi muito rica. Quando nos deparamos com aquelas dívidas com os professores de 2014 ou 2015 até aqui, falei para a minha equipe: não podemos avançar sem olhar para trás. Saudamos todas as dívidas. Hoje, não devemos nada. O Tocantins pagou tudo que era devido aos professores. Foram mais de R$ 300 milhões em pagamento de direitos. Os professores tiveram os seus direitos reconhecidos, sem precisar recorrer a empréstimos consignados, com antecipação, pagando juros, os direitos foram reconhecidos e quitados. Porque a gente precisava convergir isso para ações futuras. Então se você tem um professor motivado você tem um resultado melhor. No que diz respeito a intervenções físicas, nós estamos hoje com cerca 200 obras das 500 escolas estaduais. Temos hoje 200 intervenções entre escolas em reforma, em conclusão, construção de escolas em áreas indígenas, reformas sendo executadas pelas próprias associações, que repassamos os recursos; escolas que estavam paradas que voltam a funcionar; equipamentos tecnológicos que estão sendo adquiridos, mobiliário; fizemos uma aquisição gigantesca de computadores. Toda escola tocantinense está recebendo computadores, agora. Estamos melhorando o ambiente, dando condições, adquirindo material específico para recomposição da aprendizagem. Estamos criando alicerce para o futuro que é forte investimento em tecnologia. Meu sonho é chegar numa escola do Estado do Tocantins e encontrar internet de alta velocidade, com o aluno com um chromebook na mão, com o professor dispondo de recurso tecnológico e nós podendo fazer intervenções daqui. E isso já está sendo uma realidade. A gente começa a cumprir um planejamento feito em 2022, onde o governador Wanderlei Barbosa deu muita prioridade para educação. Estamos adquirindo laboratórios de ciências, biologia, de química, para todas as escolas. Isso tudo pensando numa educação de qualidade. O governo tem trabalhado muito, dando autonomia para a equipe e os resultados estão aparecendo. Pela primeira vez na história fechamos o orçamento de 2022 cumprindo 25,74% do orçamento geral do estado de investimento na educação. Geralmente é somente 25%, esse 0,74% significa muito dinheiro num universo de bilhões. Nós tivemos um incremento. Foi o olhar do governo do Estado, e é um dado efetivo. A educação tocantinense teve um aporte financeiro, no ano passado, muito maior do que nos anos anteriores.